Indy Vandark

domingo, 27 de maio de 2012

Despertando para o Inconsciente



Depois de fazer essas anatações em meu diário vou até a cozinha e preparo um chá. Olho pela janela e vejo o segundo sol se pondo. Um azul de cobalto paira no horizonte me lembrando aquela chama roxa que saia do fogão na antiga casa de minha vó. Ela está ai em algum lugar, depois do episódio do mágico, os mortos se levantaram e começaram a vagar entre nós. A população cresceu enormemente, mas os americanos já estão resolvendo essa questão. Foram construidos campos de concentração para conter alguns dos mortos vivos e os mutantes, Também está sendo construída a Terra 2, que concerteza não se chamará assim. Não sei por que minha vó não veio me ver até agora. Talvez seja melhor que ela permaneça distante mesmo.
Minha mãe dizia que quando nós morremos tudo acaba, tudo simplesmente chega ao fim. Percebe-se que estávamos todos enganados. Tinha um besouro morto no meu quarto no dia que minha vó morreu. Ele também deve estar aqui agora. É estranho pensar que as coisas tenham se tornado ilimitadas. Se eles não morreram, então o que aconteceu com eles? Devem ter se modificado. Quero dizer, ainda estão no caminho de mudar, por que isso vai continuar acontecendo para sempre.
Muitas pessoas se tacaram desse prédio aonde eu trabalho. Se elas não morreram, e não estão aqui agora, é por que elas rencarnaram. Em algum outro corpo. Ou em algum outro lugar talvez. Almas transmigrantes. Os solos desse prédio escuro está cheio de almas transmigrantes. O centro da cidade está cheio de almas transmigrantes.
Crianças orfãns e almas órfícas transitam pelo centro da cidade enquanto prostitutas vendem seu corpo para lagartos com falos de setenta centímetros. Isso explica por que as estrelas andam.
Está rolando um quebra quebra na rua em frente ao consultório do dentista. Parece que alguém foi atropelado. Não consigo ver nada. Tem muita coisa invisível por ai. Na verdade, acredito que eles sempre estiveram por ai ao nosso redor, só que antes não eramos capazes de enxergar. Fico olhando o chá ferver na panela liberando aquelas bolinhas de vapor e me lembro do que aprendi na faculdade, que todas as formas de vida provém da água. É verdade.
Ao bater a porta da minha sala, fico analisando o silêncio melancólico que impera nos corredores desse prédio fatal aonde trabalho. A parede verde podre descascando. O cheiro de mofo é nauseante. Alguém cagou no chão. Isso seria considerado um absurdo antes da nova ordem, mas agora, acontece até nos corredores dos escritórios de direito. A luz é fraca e fica piscando, o elevador está enguiçado, uma perfeita visão de um futuro trágico, aonde a tecnologia finalmente suplantou nossa humanidade, nos levando diretamente ao ponto de encontro com nossa natureza de macaco. Planos brilhantes estagnados, aparelhos de ar condicionado quebrados a mais de dois anos sem que ninguém se mova para conserta-los, merda no chão...
Descendo as escadas encontro com um amigo meu, o Fernando. Ele tem uma obsessão por baratas, mas isso é outra história, uma neurose humana mesmo. Ele diz para eu ficar esperto por que as coisas estão meio confusas fora do prédio, para variar. Fico tranquilo.
Do lado de fora, aquela bagunça. Ao sair do prédio olho para trás e encaro sua estatura. O prédio me parece mais lúgubre que de costume. Uma sensação estranha preenche minha alma. Será que ele sempre foi assim? Obscuro, Opressor?
Uma aura negra paira em cima do complexo de escritórios de direito aonde trabalho. Acho que vou pedir demissão. O Fernando também não estava com uma cara muito boa. Essa alternãncia, esse vai e vem de espíritos no subsolo. Acho que só iremos ter paz nesse mundo quando voltarmos a sermos o que eramos; Nada. O mito como estrutura de linguagem. Alguns acreditam em demonologia, outros em extra terrestres. Eu acredito nas coisas que eu vejo. Eu não acredito em nada.
Mas eu tenho minhas contas para pagar.
Acho chegar no carro, emerge da poça de vômito um negócio esquisito. Parece um macaco roedor. Segurando um osso na mão ele anuncia um assalto. Pobre bicho burro. Saco minha Bereta 9mm e acerto ele no meio da cara. Fico olhando o corpo daquela criatura pelada e deprimente estaltelado no chão espasmódico. Olho em seu rosto, e aquilo só aumenta minha lamentação. Pois os opostos são na verdade o mesmo, e isso agora é o que rege esse novo universo onde todo homem tem o direito de andar armado.